Houve um incêndio florestal junto a uma autoestrada, e pelos vistos alguns carros fizeram inversão de marcha. Claro que é uma atitude reprovável mas certamente desculpável.
Eu não sou psicólogo, não entendo nada de comportamentos humanos, mas sei algo que muitos, às vezes, parece que se esqueceram: uma pessoa desesperada age de forma desesperada!
Outubro não foi há muito tempo, em Junho de 2017 dezenas de pessoas, por falta de coordenação e negligência grosseira foram encaminhadas para a morte numa estrada! Tivemos Secretários de Estado a aconselharem as pessoas a não se apoiarem no Estado, que nestas emergências teriam que se safar por si, tivemos uma ministra que tutelava a Administração Interna que se vitimizou por não ter ido de férias, tivemos um Primeiro-Ministro a afirmar que estas tragédias acontecem e a garantir que certamente voltarão a acontecer!
Na verdade, certamente houve uma terapia emocional para as vitimas que sobreviveram e familiares das vitimas, e certamente o “pós-guerra” foi incrível com imensas manifestações de um povo que eu só me recordo de outra situação idêntica quando nos juntamos todos para que Timor Leste fosse independente!
E nós pá? E nós que vimos portugueses morrer de forma estúpida? E andamos a fornecer leite, água e comida aos bombeiros, e fomos ajudar a população local, e eu que pela primeira vez que fiz uma chamada de valor acrescentado para ajudar e que telefonei para saber como poderia oferecer uma mobília de quarto a quem poderia precisar? E os milhões de pessoas que colaboraram?
É que traumatizados estamos todos! Muitos traumatizados, e infelizmente, e as único conforto e garantia que temos que choveu mais e está mais frio. Os meios aéreos tardam a chegar, com pompa e circunstância criam-se unidade XPTO de combate aos fogos, mas que depois não possuem meios de transporte e equipamento adequado! Aparentemente estamos ao “Deus dará” e que S. Pedro nos proteja.
De maneira que os dirigentes deviam estar envergonhados que perante situações desesperantes os cidadãos ajam de forma desesperada porque possuem a sensação que estão entregues a si próprios, e mudar essa sensação e mentalidade não demora um ano ou dois, leva muito tempo.
Há um ano, o senhorito Lima, criança na altura com 5 anos, apercebeu-se da gravidade da situação, e então, andou a papar telejornais atrás de telejornais, pedia para fazermos menos barulho para ele ouvir as notícias, teve pesadelos, passou a entrar em pânico com churrascos, e se não foi difícil tentar desviar-lhe a atenção, também não fácil garantir-lhe que vivemos num mundo tranquilo.
Em Outubro, fomos auxiliar familiares meus em Serpins a reerguerem um pouco a sua vida. O garoto também foi, mas o fumo ainda saía do fundo da terra, o terreno estava quente e aquilo impressionou-o até hoje.
Ontem regressámos de novo e o puto tinha medo de ir, se haveria ou não fogo, e se isto e se aquilo, e portanto eu acho que o aconteceu no ano passado foi traumatizante para todos, para um povo inteiro, e vai demorar bastante tempo a restaurar a confiança.