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Portugal que futuro? O tempo das mudanças inadiáveis :)

A frase que dá titulo a este meu breve texto é plagiada, sem qualquer remorso ou pingo de vergonha, de um livro com esse mesmíssimo título, publicado em 2009 (há 15 anos…). O “smile” é meu, e espero poder explicar inteligivelmente a sua razão ao longo destas linhas. 

O livro em apreço resume uma entrevista do jornalista Eduardo Dâmaso, um dos fundadores do Público e, desde 2007, um dos pilares de valor do Correio da Manhã, ao saudoso Medina Carreira. Livro que desencantei, uma vez mais, no meu alfarrabista preferido na Rua das Portas de Santo Antão em Lisboa, e que me custou a módica quantia de 1 euro. Ainda há quem diga que a cultura, o conhecimento, a sabedoria, a informação são caras.

Não posso obviamente resumir um livro de mais de 200 páginas num artigo de opinião que se quer curto, e não exija ao potencial leitor mais de 3 a 5 minutos de esforço de concentração, para que ele não se aborreça, e abandone a leitura antes do fim. Mal dos nossos tempos de falta de tempo para o substantivo (presunção minha), e tempo em excesso para o secundário. Até porque o livro tem nas suas páginas conteúdo de qualidade suficiente para escrever no mínimo meia dúzia de artigos.

O que me estimulou hoje para agarrar na “pena” digital e pôr-me a escrever foi a conversa que tive com o Sr. Paulo, o técnico da Bosch que veio fazer manutenção à minha caldeira, há uns dias atrás. O Sr. Paulo, homem experiente, de 60 anos de idade, mais de 40 a trabalhar na mesma empresa, onde entrou ainda muito jovem, é daquelas pessoas que tiraram um PhD na Universidade da Vida (cum laude), o que lhe deu toneladas de sentido comum, e de cultura de sobrevivência. Do seu modesto salário financiou uma casita própria, integralmente paga, e o curso superior dos dois filhos. No carrito da mulher (o dele é de trabalho, da empresa) já acabou de pagar as letras. A caminho da reforma, dentro de poucos anos, o Sr. Paulo vive com a mulher (filhos criados, e a viver a sua vida), livre de dívidas de qualquer natureza. Interessa-se pelo mundo que o rodeia e, como qualquer português que viveu o 25 de Abril  de 1974 (ele tinha 10 anos), segue a política nacional, e tem opiniões bem fundamentadas sobre aquilo em que os partidos políticos que nasceram no pós-25 de Abril transformaram a nossa jovem democracia : uma ópera-bufa.

O Sr. Paulo, depois me sondar cautelosamente, para ver que tipo de cor política eu teria, criticou fortemente o PS e o PSD por terem chumbado a proposta da IL de criação de um círculo de compensação que elegeria 30 deputados, e daria corpo e aproveitamento às centenas de milhar de votos (quase 800 mil) que na última eleição foram perdidos pelo atual método de cálculo. 

Os comentários (com alguns impropérios – de salão – à mistura) que o Sr. Paulo fez, sem nunca ter lido o livro de Medina Carreira garantidamente, são totalmente coincidentes com este pequeno excerto da página 28 que copio do longo intróito (mais de 30 páginas) que Medina Carreira escreveu ao seu próprio livro (lembro, escrito há 15 anos):

“Os nossos principais partidos políticos nem sempre se têm comportado com suficiente lisura. Prometem o que nem sequer sabem se podem cumprir. Prometem e, pura e simplesmente, não cumprem. Prometem mesmo o que já sabem que não podem cumprir. Fazem o que se comprometeram a NÃO fazer. Fazem, enfim, o que lhes convém, e não o que convém à sociedade. Com alguma gente que não serve, e pelo uso de processos sem clareza ou sem seriedade, aqueles partidos cavaram um fosso enorme que os afasta, cada vez mais, da sociedade. O nosso país está a suportar, assim e inconscientemente, a ação de um sistema político-partidário fechado sobre si mesmo, com reduzida qualidade, intencionalmente “armadilhado” na criação dos requisitos para a sua sobrevivência e, até agora, sem qualquer capacidade para promover a sua requalificação … Só eles comandam um sistema que ainda não começou a resolver os nossos maiores problemas e que, pelo contrário, nos conduziu ao estado deplorável de decadência em que nos encontramos. Os grandes partidos têm de mudar, porque essa é a condição necessária da mudança do que entre nos está errado e podre.”

15 anos depois, e pelo que vemos na prática política atual, o sistema está não só podre, mas putrefacto. Vemos PS e CHEGA a unirem-se em alianças contra-natura, para fazer não o que o país precisa, mas para tramarem o PSD. E vemos o PSD e o PS a unirem-se mafiosamente e manhosamente para votarem na continuidade de um sistema, o descrito por Medina Carreira, que os beneficia no curto-prazo, mas que a longo prazo garantidamente levará ao seu fim. 

Tempo de mudanças inadiáveis, dizia Medina Carreira… O que diria ele hoje se soubesse que 15 anos depois está tudo na mesma, ou pior ? Entendem o smile ? É para não chorar copiosamente com a maldição de ver os anos, os lustros, as décadas a passar, e constatar que Portugal continua um país adiado por intriguismo, mediocridade, inépcia e corrupção da classe político-partidária que nos tocou na sina. 

A minha esperança reside nos jovens deste país, que depois de anos de alheamento finalmente se deram conta de que precisam de ter participação ativa no processo de transformação do país político, para que dentro de um par de décadas tenham ainda um país independente, e não sob tutela vigiada estrangeira. Mas atenção, dizer CHEGA não chega… Porque o populismo ignaro e oportunista encaixa-se como uma luva na forma em que Medina Carreira descreve os partidos, e o sistema, com o tempo, acaba por os conduzir a todos ao mesmo lamaçal. 

Encerro com uma frase de Medina Carreira também, que descreve o caminho para a redenção : “Os métodos para a ascensão ao exercício do poder devem privilegiar a verdade, a clareza, o rigor e o respeito pela possibilidade de cumprimento integral dos compromissos assumidos.” E mais nada.

José António de Sousa

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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