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Lições a tirar dos tumultos em França

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Não é fácil identificar as causas profundas dos tumultos que tomaram conta de dezenas de idades em França e as suas consequências no futuro depois da morte do jovem de origem argelina Nahel M. por disparo de um polícia. Para já, é a perplexidade que permanece perante a dimensão brutal da violência urbana e da indescritível destruição de equipamentos públicos e bens privados, do caos e das pilhagens de comércios, da descoberta do fogo de artifício como arma, do uso eficiente das redes sociais para organizar as investidas, da cólera cega que tomou conta das ruas.

Muitas das análises que têm sido feitas nos últimos dias em França para tentar compreender o que se passou, associam a exclusão social, a discriminação, o racismo e a xenofobia e a violência policial à origem dos tumultos. E por estas causas estarem presentes, com maior ou menor dimensão, nas nossas
sociedades, é preciso, acima de tudo, tirar lições.

Mesmo que os contextos sejam completamente diferentes, estes fenómenos também existem em Portugal, particularmente o racismo e a xenofobia, que têm sido potenciados com o aparecimento do Chega e de outros movimentos extremistas. E é perigoso negá-lo. Fazer como o Chega, que diz no Parlamento que “o racismo e a xenofobia são uma treta para desviar as atenções do que interessa”, é
uma forma de encobrir toda a violência xenófoba que aqui e ali vai ocorrendo, desculpando os agressores e sem ir à raiz dos problemas.

O sentimento contra os estrangeiros é muito fácil de alimentar, em função da origem, cor da pele, religião ou do estatuto social. De algum modo, os atos racistas e xenófobos são uma forma de cobardia de alguém que julga que tem o direito de apontar o dedo a uma pessoa que sabe ter uma condição de vulnerabilidade.

Se o preconceito contra estrangeiros for alimentado, como faz a extrema-direita, então estaremos também a criar as condições para um aumento dos casos de violência xenófoba e racista contra pessoas concretas, que é o caso de Portugal e noutros países onde as correntes anti-imigração têm prosperado, com o paradoxo de que é por demais óbvio que as nossas sociedades precisam dos migrantes, por razões éticas, laborais e demográficas.

Infelizmente, começa a ser mais visível a xenofobia em alguns Serviços Públicos portugueses contra estrangeiros que precisam de resolver problemas burocráticos para poderem residir e trabalhar no país. Alguns funcionários, em vez de ajudar essas pessoas, que já pagam impostos, mas estão sempre numa
situação de fragilidade, tratam-nas com desdém, indiferentes à angústia que causam nelas, o que é profissionalmente e humanamente inaceitável.

E há também exemplos de comportamentos indignos entre as forças de segurança, como foi o caso dos cinco agentes da GNR que em Odemira insultaram e humilharam um cidadão nepalês, que depois de terem sido condenados, acabaram por ser reintegrados na corporação, após o Tribunal da Relação de Évora lhes ter reduzido as penas, o que é uma forma de desculpabilização intolerável para os atos que cometeram.

Portanto, uma das lições que se podem tirar dos tumultos em França, é que o combate à discriminação, à exclusão, ao racismo ou à xenofobia policial devem estar entre as prioridades da ação política, para garantir a coesão social e a convivência em sociedade.

Ao contrário do que diz a extrema-direita, que nos seus discursos vai alimentando a rejeição contra estrangeiros, por exemplo, quando diz que não se pode deixar entrar toda a gente de qualquer maneira ou associa os imigrantes à delinquência, é preciso ter em conta que os problemas que afetam as nossas sociedades são complexos e não se resolvem com leis regressivas, humilhações ou incitamento ao ódio contra migrantes. Nunca nos devemos esquecer que a História de Portugal é estruturalmente feita de migrações.

Resolvem-se com boas práticas públicas, serviços eficientes para os imigrantes, com uma Justiça e forças de segurança com padrões éticos, inclusão económica e social, pedagogia e humanismo e um combate cerrado a todas as formas de discriminação e discursos de ódio.

Deputado do PS

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