Havia no ar um receio sobre o resultado das eleições para o Parlamento Europeu: que a extrema-direita crescesse muito, ao ponto de poder pôr em causa o próprio projeto europeu. Mas isso não aconteceu, nem em Portugal nem na União Europeia, em que foi clara a opção dos eleitores pelos partidos europeístas. A Europa pode, pelo menos por agora, respirar de alívio, mesmo que estes resultados representem um sério aviso para os partidos europeístas.
Em Portugal o PS ganhou por uma margem ligeiramente superior àquela com que perdeu nas eleições legislativas de março passado e conseguiu eleger mais um deputado do que a AD. É uma vitória de assinalar porque ainda há pouco mais do que dois meses o PS perdeu 42 lugares de uma maioria absoluta depois de uma dissolução indevida da Assembleia da República. E isto num contexto em que o Governo não parou de fazer anúncios de decisões que se confundem com campanha eleitoral.
Merece também uma palavra a cabeça de lista do PS, Marta Temido, pela campanha incansável que fez, marcada por uma grande simplicidade, humildade e empatia.
Quanto à AD, deve ser destacado o apoio dado por Luís Montenegro a António Costa para presidente do Conselho da União Europeia, o que só pode ser um orgulho para Portugal, poder ter, mais uma vez, um português à frente de uma instituição multilateral com esta relevância em termos globais, o que também é possível pelo facto de a família socialista no Parlamento Europeu continuar como a segunda força política.
O grande derrotado foi a extrema-direita do Chega, que tinha grandes ambições e ficou muito aquém de as concretizar. Felizmente. O ambiente que tem criado tornou o país e o Parlamento irrespirável e tóxico, com uma tensão permanente e com o discurso de ódio a espalhar-se pela sociedade de uma maneira intolerável. Mas estas eleições mostraram também o verdadeiro rosto autocrático de André Ventura, que se comparou a Salazar. Como é possível que depois de 50 anos de ditadura alguém tenha perdido a vergonha de se comparar com a figura mais sinistra da história de Portugal, que trouxe ao país repressão, tortura, guerra, ignorância, pobreza e isolamento internacional?
Além da boa notícia dos maus resultados do Chega, temos também, felizmente, boas notícias que nos vêm da Europa, porque afinal a extrema-direita não cresceu como previam as sondagens. O que prova que, apesar da presença muito preocupante da extrema-direita um pouco por todo o lado, os cidadãos europeus continuam a considerar que o projeto europeu vale a pena. Porém, as más notícias vêm de França e da Itália. Em França, os resultados foram catastróficos, devido à vitória esmagadora da extrema-direita de Marine Le Pen, embora expectável, como indicavam as sondagens. O que não se esperava é que o presidente Macron convocasse eleições antecipadas, o que é uma decisão de alto risco que pode deixar um dos países fundadores da União Europeia nas mãos da extrema-direita, antieuropeia e amiga da Rússia. A situação é, por isso, muito preocupante. Como é preocupante a vitória expressiva de Georgia Meloni em Itália, que já defendeu o fim da União Europeia quando estava na oposição e não escondia a sua simpatia por Vladimir Putin, mas que agora, que é primeira-ministra, tenta fazer-se passar por uma europeísta respeitável, mesmo sendo líder de um partido herdeiro do fascismo de Mussolini, o Fratelli d’Itália.
Apesar da extrema-direita não ter aumentado, se contarmos os resultados dos Conservadores e Reformistas Europeus, Identidade e Democracia e Não-Inscritos, a preocupação não desapareceu e é preciso continuar a cuidar e defender o projeto europeu de todos aqueles que o querem destruir, que são muitos, infelizmente.
Paulo Pisco