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Mértola: um segredo bem guardado no coração do Alentejo

Já falta pouco!

Passei Castro Verde há pouco mais de dez minutos e sinto que o meu destino já não vai tardar muito a aparecer logo a seguir a uma das muitas curvas com que me vou cruzando.

Mértola é já ali.A ansiedade toma aos poucos conta de mim.Passaram dezoito anos desde que aqui estive pala última vez e hoje tal como nessa altura percorro a mesma estrada e vejo as mesmas paisagens.Pouco ou nada mudou!Este é o Alentejo no seu estado mais puro.

E de repente o momento que tanto desejei acontece.

Lá esta ela!Linda como sempre,vestida de branco e com o castelo a fazer o papel de coroa.

Mértola ergue-se diante mim em todo o seu esplendor, na margem direita do Rio Guadiana. Não tenho dúvidas que esta é uma das mais bonitas vilas alentejanas.

É bom estar de volta…

Quase sem aviso prévio as memórias do passado invadem-me a uma velocidade estonteante. Lembro-me quando em menino aqui vinha com a minha mãe passar alguns dias no verão. Lembro-me de brincar com os meus primos e de tomar banho nas azenhas. Lembro-me das conversas e risadas nas noites abrasadoras,sentados à porta da casa dos meus padrinhos. Lembro-me de pessoas que infelizmente já não estão entre nós mas que de certa forma fizeram parte da minha infância.
Mértola está-me no sangue. Faz parte de mim. Praticamente toda a minha família materna nasceu e foi aqui criada. Um pouco de mim está e sempre esteve aqui.

Quero rapidamente sair do carro e respirar aquele ar quente,e sob o céu azul percorrer as ruas estreitas ladeadas de casas caiadas de branco,onde noutros tempos caminharam povos árabes.

A chamada Vila Museu soube manter a sua identidade. A história deste local está escrita um pouco por toda a parte, onde os vestígios do passado coabitam de forma harmoniosa com as construções do presente.

Desta vez e com muita pena minha a visita vai ser rápida. São só dois dias. Tenho 48 horas para viver e reviver momentos únicos, visitar locais que me trazem memórias e recordações.

Devem estar mais de 30 graus, mas mesmo assim lanço-me à conquista das ruas desertas onde só os gatos parecem não se importar com o calor abrasador, quase sufocante e que me obriga a caminhar devagar.

Quero muito ir ao Castelo. O caminho é sempre a subir e bastante irregular, fruto da calçada de pedra bruta e gasta que me faz escorregar de vez em quando.

Inevitavelmente passo pela Igreja Matriz que nos tempos da ocupação árabe foi uma mesquita e da qual ainda resta o minarete. Entro, não há mais ninguém a não ser uma senhora baixinha sentada numa secretária que se apressa a dar-me as boas vindas ao mesmo tempo que me tenta vender uns postais.

Lá dentro o silêncio é absoluto. Enquanto observo o que me rodeia, reparo nas portas e nos vestígios do antigo Mihrab por detrás do altar que mostram de forma evidente a origem islâmica do edifício.

Estou de volta ao exterior e de novo sou presa fácil para o calor abrasador que se faz sentir. A garrafa de água que trago na mochila já vai a meio.Caminho meia dúzia de metros e faço nova paragem.

Desta vez é o Campo Arqueológico (Alcáçova) que desperta a minha atenção.Segundo os entendidos foi aqui que Mértola nasceu. Nessa época com o nome Myrtilis e sob o domínio romano existiu neste local um pequeno povoado. Mais tarde e depois da conquista Árabe, mais edifícios foram construídos e muito do que atualmente aqui vemos data desses dois períodos.

Recordo-me perfeitamente de aqui andar há 18 anos. Nessa altura era tudo mais básico e com pouca informação para o visitante.

Hoje constato com alegria que se valorizou o espaço e foram colocadas placas com descrições detalhadas de cada um dos locais, assim como uma reconstituição de uma antiga habitação de origem Islâmica.

Chego finalmente às imediações do Castelo que é simbolicamente guardado pela Estátua Equestre de Abu al-Qasim Ahmad. Entro pelo grande portal. Sigo o caminho que me conduz ao interior da imponente fortaleza,datada da época cristã e que muito contribuiu para a defesa militar desta zona do país.Aqui pouco ou nada mudou deste a minha última visita.

A Torre de Menagem domina todo o espaço. Este é o ponto mais elevado, e de onde consigo ter uma vista fantástica de toda a vila. Lá em baixo avisto o Rio Guadiana que por agora corre tranquilo e com pouca água.

É precisamente para lá que sigo. Vou descendo rua após rua, travessa após travessa, sempre só, eu e a calçada, os gatos e as muitas andorinhas que todos os anos por esta altura regressam a casa.

Pessoas,nem vê-las! Onde anda toda a gente?

Já avisto a emblemática Torre do Relógio que se ergue no limite da antiga muralha e que até à bem pouco tempo serviu de lar a um casal de cegonhas. Logo ali à frente fica o bonito edifício da Câmara Municipal que conto visitar mais tarde.

Desço as escadas que me levam praticamente até à margem direita do Guadiana, onde caminho por breves momentos só parando para descansar um pouco no local onde a Ribeira de Oeiras se junta ao Grande Rio.

Já passa da hora de almoço e a barriga há já algum tempo que começou a reclamar. O calor é agora quase insuportável. Regresso a casa onde sou recebido com uma típica e deliciosa Açorda Alentejana, temperada com muito alho e coentros tal como gosto.

Como já referi, a história de Mértola está escrita um pouco por toda a vila e como tal foram criados diversos Núcleos Museológicos que preservam e mostram os vestígios de um passado longínquo que felizmente resistiu ao tempo e chegou aos nossos dias.

Existem pelo menos dois ou três que quero visitar.

A primeira paragem da tarde acontece na Casa Romana, um pequeno Museu situado sob o edifício dos Paços do Concelho, descoberto por acaso aquando da realização de algumas obras de remodelação do espaço. Aqui tive a oportunidade de ver as ruínas de uma antiga habitação e vários fragmentos arqueológicos que provam que a casa foi habitada durante o período em que Mértola foi ocupada pelo povo Romano.

Nesta minha ronda pelos museus da vila o Museu Islâmico não podia de forma alguma ficar de fora. O espaço bem cuidado encontra-se instalado num bonito edifício que em tempos pertenceu a uma das mais influentes famílias da região. Aqui podemos ver aquela que é muito provavelmente a mais importante coleção de arte Islâmica de Portugal. Todas as peças existentes são o resultado de muitos anos de trabalhos arqueológicos realizados em diferentes locais de Mértola.

A dois passos do Museu Islâmico fica o Museu de Arte Sacra, que na minha opinião não é tão interessante como os dois primeiros, mas que de qualquer forma merece ser visitado por se encontrar instalado no interior da Igreja da Misericórdia,construída em 1558.

Neste local estão guardadas um sem número de peças de cariz religioso de onde se destacam os antigos altares quinhentistas da Igreja Matriz.

Fiz igualmente uma visita rápida ao Museu da Tecelagem e à Casa de Mértola, ambos situados nas imediações do Posto de Turismo.

Na minha última passagem por Mértola todos estes Museus ainda não existiam, como tal esta segunda parte da visita de hoje acaba por ser um tanto ao quanto menos sentimental. Mesmo assim não consigo evitar que certas memórias venham de vez em quando à tona. Sinto-me agora um mero turista que visita um qualquer local no mundo pela primeira vez.

Está um final de tarde fantástico. Depois de um dia inteiro em que me mantive na chamada vila velha,encontro-me agora pela primeira vez no exterior das muralhas. Não quero parar por aqui,quero continuar a percorrer este pequeno pedaço de paraíso.

Faço uma breve pausa no mítico Café Guadiana. Sento-me na esplanada, bebo um refresco e por momentos fico ali a observar as pessoas que agora sim, parecem ter começado a sair à rua. Talvez porque o calor já não está tão intenso. A vila acordou!

O objetivo agora é conhecer um pouco desta zona. Talvez vá até à Ponte Nova. Quem sabe se não termino o dia com os pés de molho nas Azenhas, naquelas mesmas águas onde em criança me banhei.

Vou andando, sem pressas, parando aqui e ali. De certa forma sigo o meu caminho um pouco ao sabor da brisa que se vai levantando.

Nessa noite regresso a casa já depois do sol se ter posto. O serão é passado em família. Falamos, rimos, contamos estórias e revivemos momentos de outros tempos.

Se existem dias perfeitos?

Claro que sim, e este foi um deles!

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